Os Desafios da introdução de tecnologia no setor florestal

Por Ronaldo Soares, Gerente Geral Florestal da divisão de Agricultura da Hexagon

Madeiras cortadas em uma floresta plantada

03 novembro 2022

A digitalização já chegou na floresta, a cada dia mais e mais processos sofrem incorporações de softwares e hardwares, produzindo uma infinidade de informações. Apesar de possuirmos um terreno totalmente inexplorável e com uma gama quase desconhecida para adquirirmos novos conhecimentos, ainda temos alguns desafios a serem vencidos.

Enquanto a área de colheita absorveu a tecnologia escandinava, introduzindo harverters, forwarders, skidders e clambunks, seja saindo de uma atividade que utilizava como base motosserras, descascadores, autocarregáveis e caminhões com baixa capacidade de carga. Quando falamos da implantação de florestas, esta atividade segue os passos do processo evolutivo e tecnológico ainda da agricultura, que por sua vez, sempre está a um passo à frente quando falamos de inovação.

Existem alguns motivos pelos quais esta diferença temporal ocorre, entre alguns deles observamos:

  • O ciclo curto da maturação e comercialização de produtos agrícolas, leva a uma análise de investimento e resultados com maior velocidade.
  • O grande interesse dos fabricantes de máquinas agrícolas neste mercado, devido à alta demanda de produtos.
  • Uma gestão mais vertical, o que muitas vezes facilita a tomada de decisão, agiliza a aquisição e adoção de novas tecnologias, pois a poucos envolvidos no que tange aos riscos do investimento. 

Segundo a Fenabrave (2021) a comercialização de máquinas agrícolas foi de 58.733 unidades, com um acumulado dos últimos 5 anos em 239.094 exemplares. Estima-se que o mercado florestal represente apenas entre 1 e 3%, o que explicaria o desinteresse dos fabricantes por este segmento.

A própria busca de dados sobre o setor de produção e comercialização de máquinas e implementos florestais já é um grande desafio. Isto acontece porque temos menos de uma dezena de grandes fabricantes especializados na área e uma centena de fabricantes de menor escala, que competem ferozmente com o budget do setor de silvicultura. A grande fatia de mercado está concentrada nos pequenos fabricantes e entusiastas do setor e que por uma questão geográfica/organizacional, não possuem nenhum tipo de associação e estatística. 

A falta de opções em fabricantes de implementos florestais para a silvicultura não é um problema exclusivo da América, isto também é observado em outros continentes com uma causa muito similar: o baixo número de vendas deste mercado. A silvicultura no que abrange a implantação de   floresta até sua colheita compartilha do mesmo problema independentemente de que parte do mundo você esteja. 

As empresas procuram encontrar soluções locais, que é aquele prestador de serviços, que geralmente atende o setor metal mecânico ou pequenos fabricantes de implementos e que deslumbram com esta oportunidade, ampliar os seus negócios. Motivados pela operação de silvicultura em desenvolver soluções, normalmente dão um primeiro passo através de um protótipo e que após várias tentativas de erros e acertos conseguem raramente transformar esta em um produto comercial universalizado. Algumas empresas subsidiam estes processos, tanto financeiramente quanto tecnicamente, pois há uma necessidade de conhecimento operacional técnico-científico silvicultural para suportar este desenvolvimento. Embora isto ocorra, já conseguimos observar ao longo dos anos que não é suficiente para suportar esta iniciativa. Temos então, uma deficiência de recursos financeiros e por consequência, nível técnico de fabricação e projeto construtivo por parte destes fornecedores de solução, o que reflete em equipamentos com baixo nível de padronização e tecnologia, embora todo esforço e motivação tenha sido empregado. 

As próprias incertezas ou pedidos customizados de uma mesma empresa, ou empresas vizinhas com uma demanda operacional muito similar acaba dividindo ainda mais este pequeno setor de fornecedores, competindo pelo mesmo recurso e mercado. Não é incomum numa mesma empresa encontrarmos na operação, 30 ou mais equipamentos que embora tenham sido fabricados por um ou dois fornecedores, tenham entre si, diferenças tão significativas, que para a introdução de tecnologia se faz necessário uma alteração e adaptação substancial. Fato este que onera os custos, toma tempo e muitas vezes inviabiliza até mesmo a implantação neste equipamento. Facilmente teria sido resolvido com um projeto fabril padronizado e tecnológico.

A adaptação de implementos agrícolas para o setor florestal não é uma tarefa simples, pois existem características de cada setor que determinam a robustez, a qualidade, engenharia de construção e o nível tecnológico. Dentre estas diferenças, podemos citar o número de horas utilizado/ano/equipamento, as condições de terreno, como por exemplo a existência de tocos e resíduos, topografia e a própria terceirização.

Na dinâmica deste desafio temos 4 atores principalmente envolvidos:

  1. As empresas de celulose e derivados de madeira.
    As empresas do segmento florestal por sua concepção têm o foco baseado no seu produto final, destinando a maior parte dos seus recursos para este fim. Um dos fatores que pode influenciar nesta redução de investimentos do início de uma implantação florestal é provavelmente o ciclo longo, mais de 6 anos. Esta longa espera por colheita traz à tona muitas incertezas ao investidor/gestor de quais garantias de retorno. Dúvidas essas difíceis de serem respondidas em função das variáveis, como clima, pragas e doenças, escolha genética e situação política econômica.
  2. Prestadores de serviços.
    Quando falamos de prestadores de serviços, também o seu “core business” está em metas de implantação e manutenção de florestas, não tendo tempo, nem recursos ou pessoal habilitado para o desenvolvimento de máquinas, contudo se vê em função das dificuldades já expostas a necessidade quase “sine qua non” de sobrevivência se aventurar por estes caminhos de desenvolvimento e fabricação. O resultado nem sempre é o esperado e geralmente caem no mesmo problema dos pequenos fabricantes de implementos.
  3. Pequenas empresas de implementos.
    Os pequenos fabricantes, mais não os menos importantes e entusiastas do setor, são verdadeiramente o esteio da mecanização e modernização da floresta. Seu tamanho e capacidade técnica está diretamente interligado com o aporte financeiro a eles dedicado. Embora que nos últimos anos se observou a entrada de novos fabricantes, também vemos muitos fabricantes tradicionais saindo do setor desmotivados com a falta de investimento. Aqui estamos falando não apenas de recurso financeiro, mas também de conhecimento técnico. Em outros lugares do mundo, como Europa, EUA, Canadá, entre outros; já utilizam comumente o padrão ISOBUS de comunicação, que permite a integração trator e implemento independente da marca, ampliando a coleta de dados da operação. O mercado estabelecido, padronizado dos grandes fabricantes de máquinas e implementos no Brasil ainda não conseguiu implementar de forma maciça o ISOBUS, devido a legislação e padronização das fabricas. Então, imagina o quão tardio isto irá ocorrer nos pequenos fabricantes.

Grandes fábricas de máquinas agrícolas e colheita florestal.
Os grandes fabricantes, principalmente os de tratores, harvester e forwarders, tentam desenvolver produtos baseados nos bons resultados e valores agregados da colheita florestal. Porém desenvolver soluções inovadoras mesmo com um mercado limitado, não é uma tarefa tão fácil e esta ação é insuficiente para a tão desejada floresta 4.0 acontecer. O que é necessário entender é que a velocidade de demanda de mercado corre sempre à frente dos investimentos, e isto se agrava no tempo que estamos vivendo, na era da informação, do agora!

Então, qual a solução para vencermos estes desafios? Não existe uma ação individual, nem uma resposta simples, mas acreditamos que uma sinergia maior entre os envolvidos, grupos de estudos específicos, universidades e especialistas com recursos financeiros e técnicos adequados encontraram a resposta. 

Por fim, o que podemos observar é que a distância tecnológica entre os setores agrícola e florestal tem diminuído a cada ano. Parte disto acontece em função dos grandes investimentos que estão ocorrendo no setor florestal com novas fábricas e ampliação da produção. Até mesmo a própria competitividade no setor e a disponibilidade de informação que temos nos dias de hoje em apenas um click na palma da nossa mão, conseguimos verificar em qualquer setor ou parte do mundo o que está acontecendo em termos de novidades e inovação, fazendo com que isto contribua muito para reduzir este “gap” tecnológico entre os dois setores, impulsionando o setor florestal para um novo patamar.